Gonçalo Nuno Santos dirige o Centro das Comunidades Madeirenses há 25 anos. Numa entrevista ao AgoraMadeira, o governante fala sobre sobre novos projetos de cooperação com a África do Sul e a Câmara de Comércio Luso-Francesa. Na primeira parte da entrevista hoje publicada, Gonçalo Santos pede também o direito dos emigrantes a votarem nas Legislativas Regionais e deixa críticas à TAP e ao Governo da República. A segunda parte desta conversa será publicada no próximo dia 8.
Qual é a principal função do Centro de Comunidades Madeirenses?
“É unir o que o destino desuniu. Ou seja, fazer com que os madeirenses onde quer que vivam, em qualquer parte do Mundo, façam parte da mesma família. Se a Madeira vivesse sozinha, apenas rodeada pelo mar, era uma ilha sem importância e condicionada a 262 mil habitantes. Mas a Madeira tem 1 milhão de pessoas em vários cantos do Mundo e é uma ilha que é conhecida pelo setor do Turismo, a partir do século XVII, e pelo setor das Comunidades Madeirenses, a partir do século XVIII. São estes os setores pelos quais a Madeira se afirma no Mundo”.
Há um registo atual aproximado do número de emigrantes que se encontram a residir no estrangeiro?
“Ninguém no Mundo poderá responder a essa pergunta por ser difícil de contabilizar, mas pensamos que a África do Sul é o país que tem o maior número de pessoas e segue-se a Venezuela.
No Canadá há, na Costa Atlântica e na Costa do Pacífico, pelo que se sabe, 50 mil madeirenses. Já a Austrália é considerada uma das mais importantes comunidades madeirenses porque 80% da emigração na Austrália é madeirense. Seguem-se os Estados Unidos e o Canadá.
Nota importante para a emigração madeirense em Jersey que corresponde a 17% da força laboral da ilha, sendo que 10% da população total de lá é madeirense. É em Jersey onde os acordos de amizade entre Governos funcionam da melhor forma. Mas, há ainda emigração madeirense espalhada por todo o Mundo, desde o Qatar ao Dubai”
Quais são os principais problemas sentidos pelas comunidades madeirenses atualmente?
“Falta cumprir o sonho fundamental. O sonho de ligar a Madeira em todo o Mundo, o que é perseguido há séculos. Todavia, isso ainda não aconteceu. Penso que os emigrantes têm de estar representados a outros níveis e que a própria Madeira deve estar representada junto às grandes comunidades madeirenses a outros níveis como, por exemplo, com a presença de bibliotecas sérias e grandes da Madeira no Mundo. Há muito trabalho a fazer, mas muito já foi feito. Aliás, a Madeira tem sido um exemplo na dinâmica da construção de uma sociedade onde inclua madeirenses residentes e ausentes”.
Os emigrantes não têm mostrado um grande interesse em saber tudo sobre a Madeira onde quer que estejam?
“Há esse interesse. Os emigrantes “teimam” em singrar na sociedade que os acolhe no país recetor ou de acolhimento e têm tido uma grande luta nesses países para se afirmarem com a excelência que se têm afirmado. E nós, aqui na Madeira temos tido uma grande luta para desenvolver a ilha. O meu sonho é que haja uma ponte permanente entre madeirenses onde quer que se encontrem no Mundo, ao nível da universidade, do comércio, dos negócios, das descobertas na medicina, dos congressos e isso ainda não está completamente pronto”.
O PROBLEMA DAS LIGAÇÕES AÉREAS
A falta de ligações aéreas continua a ser um problema?
“Eu sonho um dia que haja muitas ligações aéreas da Madeira com os seus emigrantes. Nunca percebi porque é que o voo para a África do Sul nunca se fez, porque é que a TAP saiu da África do Sul e porque é que o aeroporto foi feito para beneficiar as comunidades e unir os madeirenses e isso nunca se conseguiu. Tal não foi por culpa do Governo Regional mas por falta de interesse da TAP e da South African Airlines. Os homens não voam, precisam de aviões para ir de um lado para outro”…
O Governo da República podia fazer mais a este respeito?
“Sem dúvida. O Governo da República – e não o Governo Regional da Madeira porque não tem essa autonomia – devia criar incentivos mais incentivos para os emigrantes. Se se criou os Gold VISA para estrangeiros…
Portugal tem de ter em conta que metade da população portuguesa está fora do território nacional e por isso deve ter políticas muito claras de união das pessoas com a Diáspora portuguesa e elas não estão todas prontas”.
Que tipo de políticas?
“Por exemplo, se os emigrantes podem votar para o Parlamento Europeu, para o Presidente da República e para as Legislativas Nacionais porque é que não podem votar para as Legislativas Regionais que são instrumentos da Constituição da República Portuguesa?
O argumento é que não estão inscritos nos consulados por naturalidade mas por nacionalidade, mas isso devia de estar salvaguardado porque as eleições da Madeira e dos Açores são eleições da República Portuguesa e não do estrangeiro. Podíamos arranjar outras formas de participação política e cívica que tivessem mais em conta o emigrante, embora reconheça as dificuldades constitucionais e legais em toda essa matéria. É preciso lembrar que uma das grandes riquezas da Madeira é o seu povo e ele está em todo o Mundo e o povo que está do outro lado do Atlântico gosta tanto da Madeira como os que estão aqui”.
Um dos problemas que mais diz respeito à emigração madeirense é a violência na África do Sul. O momento atual continua a ser muito preocupante…
Segundos antes de ter entrado no meu gabinete recebi um telefonema da senhora cônsul geral de Portugal em Joanesburgo e estávamos a falar disso. A criminalidade na África do Sul não é feita contra os portugueses ou contra ninguém e sabemos que têm havido esforços enormes da parte do Governo Sul-Africano para tentar eliminar a criminalidade. Devo, contudo, sublinhar que a cooperação da África do Sul com Portugal é muito interessante. Eles querem já cooperar connosco ao nível dos doutoramentos e da transmissão científica dos conhecimentos de ambos os países.
Recentemente, inclusive, a Ministra da Cooperação, da Cultura e da Inovação Sul-Africana esteve em Portugal e trouxe propósitos de cooperação muito interessantes. Devo reconhecer que uma só morte é muito grave, embora nós nada possamos fazer em relação a isso, a não ser lutar e cooperar com as autoridades sul-africanas em tudo o que pudermos em matéria de segurança internacional.
O que é que destaca da visita da Ministra da Cooperação, da Cultura e da Inovação Sul-Africana a Portugal?
O Governo da República simpaticamente não disse nada à Madeira. Simpaticamente esqueceram-se que a maior comunidade portuguesa na África do Sul é madeirense e que a ligação com a Madeira é muito relevante mas isso não é importante porque na devida altura vamos receber os relatórios dessa visita. Os membros do Governo Regional da Madeira têm ido à África do Sul uma média de uma vez por ano para a celebração do Dia da Madeira e das Comunidades Madeirenses e têm feito muito para a ligação empresarial e cultural ao nível dos professores e da etnografia. Devo reforçar que para o Governo Regional as comunidades madeirenses são muito importantes porque nunca vi alguém da Madeira que não tenha um membro da família nas comunidades.
Que novidades se pode esperar para a emigração madeirense em 2015?
O Governo Regional da Madeira tem uma grande fé num protocolo recentemente assinado com a Câmara de Comércio Luso-Francesa e estamos atualmente com alguns projetos importantes em curso, mas isso só poderá ser melhor divulgado nas próximas semanas. A ideia da Sra secretária do Turismo passa por aumentar a nossa cooperação com as comunidades madeirenses ao nível da Universidade da Madeira, da parte científica e do Mundo empresarial.